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sexta-feira, 12 de outubro de 2012

JANEIRO


Enquanto esperava por ela 
Passavam crianças empinando pipas
Homens comentando política
Mulheres falando de moda
Cachorros latindo
Mendigos pedindo esmola
Padres rezando
Putas vendendo o corpo
Promessas vendendo a alma.

Enquanto esperava por ela
Crianças viravam adultos
Homens se desiludiam
Mulheres dormiam maltrapilhas
Cães adoeciam
Mendigos morriam de fome
Padres se perdiam de Deus
Putas apodreciam
Promessas entregavam a alma ao demônio.

Enquanto esperava por ela
Adultos envelheciam
Homens morriam
Mulheres também morriam
Cães nem mais existiam
Mendigos jaziam em covas rasas
Padres renegavam a fé
Putas se suicidavam
O demônio sorria.

Um dia, enfim, ela resolveu vir.
Bateu a porta, mas a porta se calou.
Chamou meu nome e o silêncio se fez saber.
Adentrou a casa tateando o escuro
e o escuro não me deu a ela. 
Procurou minha cama e a encontrou arrumada. 
Vasculhou cômodo por cômodo e, 
diante da inexorável ausência, 
atordoada, 
sentou-se na poltrona empoeirada e, 
enquanto revivia lembranças, 
eu vagava por onde me fora dado não ser:
agora fazia parte do cosmo.
Carlucho Vitaliano

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