Silvestre quer saber
porque razão eu estrago o português
escrevendo palavras que nem há.
Não é a pessoa que escolhe a palavra.
É o inverso.
Isso eu podia ter respondido.
Mas não.
O tudo que disse foi:
é um crime passional, Silvestre.
É que eu amo tanto a Vida
que ela não tem
cabimento em nenhum idioma.
Silvestre sorriu.
Afinal, também ele já cometera
o idêntico crime:
todas as mulheres que amara
ele as rebaptizara, vezes sem fim.
Amor se parece com a Vida:
ambos nascem na sede da palavra,
ambos morrem na palavra bebida.
Mia Couto, Idades Cidades Divindades, Lisboa: Caminho, 2007.
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