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quarta-feira, 23 de maio de 2012

Magistrados manifestam preocupação com texto do novo Código Florestal



A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) divulgaram nota conjunta, nesta quarta-feira, para manifestar sua preocupação com o texto do novo Código Florestal, recém-aprovado pelo Congresso Nacional.

De acordo com a manifestação, “da forma como aprovado, teme-se que o texto do novo Código Florestal traga insegurança jurídica e provoque um substancial e desnecessário aumento da litigiosidade, quando não perplexidade para os juízes encarregados de aplicá-lo”.

O desembargador Henrique Calandra (AMB) e o juiz Gabriel Wedy (Ajufe), que assinam a nota, acrescentam: “Se não corrigidos a tempo, os defeitos e imprecisões dificultarão, ou mesmo inviabilizarão, a tão almejada pacificação no âmbito da gestão pública e privada dos recursos naturais. Uma avalanche de ações judiciais somente contribuirá para intranquilizar os produtores rurais, sobretudo o pequeno, bem como a sociedade”.

Os principais pontos da nota conjunta dos magistrados são os seguintes:

O Congresso e o debate

“O Congresso Nacional deve ser festejado e defendido por todos, pois inexiste democracia sem um parlamento atuante e o respeito às leis que edita. Não é, nem poderia ser diferente com o Código Florestal. Os senhores Senadores e Deputados, legitimados pelo voto popular, são os porta-vozes naturais das diversificadas aspirações da Nação. O amplo e rico debate propiciado pela tramitação da nova lei muito contribuiu para conscientizar a sociedade da importância das florestas, dos recursos hídricos, dos desastres naturais, dos estímulos à produção de alimentos, e da sustentabilidade do agronegócio”.

Insegurança jurídica

“Os magistrados brasileiros, conscientes de suas responsabilidades constitucionais e legais, são fiéis cumpridores da legislação aprovada pelo Congresso Nacional. Para tanto, é preciso que o texto legal seja claro, sem contradições internas e externas, e esteja em sintonia com o marco constitucional vigente no País. Do contrário, resultará em insegurança jurídica e inconveniente litigiosidade, com prejuízos para todos: os destinatários das obrigações e direitos, os órgãos encarregados de sua implementação, os juízes que serão chamados a dirimir uma profusão de conflitos”.

Principais preocupações

Na nota, a Ajufe e a AMB destacam, entre outros os seguintes “pontos inquietantes”:

— “O esvaziamento de fato da proteção atual das áreas úmidas e do Pantanal, que será o bioma brasileiro mais afetado pelo novo Código Florestal. Com a nova lei, essas áreas passam a ser amplamente utilizáveis e desmatáveis (art. 4º, parágrafo 3º), ficando para o Poder Público (e o juiz) o papel de simples aplicador de “recomendações técnicas dos órgãos oficiais de pesquisa” (art. 10). Recomendações? Que órgãos oficiais de pesquisa? Como se vê, em termos de insegurança jurídica e risco de litigiosidade, o texto e o conceito de “leito regular” dos rios (art. 3º, XIX) falam por si mesmos”.

— “Também causa surpresa, depois de a questão ter sido pacificada nos Tribunais, a tentativa de integralmente transferir para os municípios a fixação da extensão e grau de proteção das matas ciliares, de encostas, de manguezais e dunas (art. 4º, parágrafo 8º), como se os maiores desastres ambientais da atualidade, com perdas de preciosas vidas humanas, não tivessem ocorrido exatamente nessas áreas”.

— “A aparente previsão de que, a partir da nova Lei, em reversão completa do sistema atual, a União e os Estados só poderão proteger espécies da fauna e da flora ameaçadas de extinção se desapropriarem os milhares de imóveis em que estas ainda venham a se encontrar, o mesmo valendo para a conservação das restingas, veredas e várzeas (art. 6º). Além de esse dispositivo contradizer outros do mesmo texto, a prevalecer essa tese, o Brasil ficará impossibilitado de cumprir as obrigações que assumiu em tratados internacionais”.

— “O uso de carvão vegetal de espécies nativas, na atividade industrial (siderurgia, principalmente), não só continua permitido, o que em si é uma das maiores causas do desmatamento de florestas no Brasil, como a partir da nova lei a “reposição florestal” — isto é, o replantio — será feita mediante “espécies preferencialmente nativas” (art. 32, parágrafo 4º). Ou seja, derruba-se mata virgem e se planta espécie exótica”.

— “Em dois dispositivos enigmáticos, a nova lei aparentemente tenta inviabilizar o combate administrativo e judicial aos grandes incêndios que devastam a vegetação nativa, mormente na Amazônia (art. 38, parágrafo 3º e 4º). Na mesma linha, dificultando a atuação judicial, regularizam-se em Área de Preservação Permanente não só as culturas permanentes e lenhosas agrícolas e de silvicultura (o que é feito corretamente pelo art. 63, caput), mas também todas as atividades “pastoris, de ecoturismo e turismo rural” (art. 61, caput)! Além disso, o texto parece indicar anistia incondicional e completa às mansões de lazer, casas de campo, hotéis e marinas construídos ilegalmente (art. 61, parágrafo 7º)”.

Apelo

A nota dos magistrados conclui com um “apelo à conciliação e pacificação”:

“Os conflitos florestais e ambientais devem ser resolvidos precipuamente pelo legislador, com a edição de leis claras, justas e tecnicamente estruturadas; o Judiciário é apenas o último recurso, o que recomenda reduzir, em vez de ampliar, a litigiosidade ambiental e florestal. Os magistrados brasileiros acreditam firmemente no alto discernimento da Senhora Presidenta Dilma Rousseff e no elevado espírito público dos membros do Congresso Nacional nesse nobre esforço de conciliação e pacificação legislativa dos conflitos florestais”.

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