Texto de Lygia Bojunga Nunes e ilustração de Monica Carreteiro
Para mim, livro é vida, desde que eu era pequena os livros me deram casa e comida.
Foi assim: eu brincava de construtora; livro era tijolo; em pé, fazia parede; deitad
o, fazia degrau de escada; inclinado, encostava num outro e fazia telhado. E quando a casinha ficava pronta eu me espremia lá dentro para brincar de morar em livro.
De casa em casa eu fui descobrindo o mundo (de tanto olhar para paredes). Primeiro, olhando desenhos; depois decifrando palavras.
Fui crescendo e derrubei telhados com a cabeça. Mas fui pegando intimidade com as palavras. E quanto mais íntimas a gente ficava, menos eu ia me lembrando de consertar o telhado ou de construir novas casas. Só por causa de uma razão: o livro agora alimentava a minha imaginação.
Todo dia a minha imaginação comia, comia e comia; e de barriga assim toda cheia, levava-me pra morar no mundo inteiro: iglu, cabana, palácio, arranha-céu, era só escolher e pronto, o livro me dava.
Foi assim que, devagarinho, me habituei com essa troca tão gostosa que do meu jeito de ver as coisas - é a troca da própria vida; quanto mais eu buscava no livro, mais ele me dava.
Mas como a gente tem mania de sempre querer mais, eu cismei um dia alargar a troca: comecei a fabricar tijolo para, em algum lugar, uma criança juntar com outros e levantar a casa onde ela vai morar.
Lygia Bojunga Nunes
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